terça-feira, 30 de outubro de 2007

EXPRESSIONISMO E WERNER HERZOG


WERNER HERZOG E O NOVO CINEMA ALEMÃO
1. REFERÊNCIAS HISTÕRICAS

O cinema alemão nunca foi um cinema de características discretas, límpidas, serenas. Nunca foi (como quase nunca o foi qualquer outra forma de expressão artística germânica) um cinema diurno, solar, aberto. Pelo contrário: como toda a cultura alemã, também ele se encontra envolvido numa atmosfera noc­turna, povoado de temores e terrores, épico e brumoso, jogando secretamente com os mais distantes contrastes, numa dialéctica imprecisa, romântica e idealista, aqui e ali de rigorosa anotação realista, mas dependente globalmente de uma menta­lidade exultante e agressiva, apaixonada e irracionalista.

ANTECEDENTES

Até fins da primeira década deste século, o cinema alemão viveu subsidiário de uma influência francesa do “film d’art”. Em 1912, “O Estudante de Praga”, de Paul Wegener, parece indicar o início de uma autonomia germânica, em matéria cinematográfica, mas a dependência económica de estúdios dinamarqueses (“Nordisk”) é flagrante. A guerra de 1914-1918 irá retardar a eclo­são de um cinema de raiz nacional. Será só em fins de 1918 que o dispositivo indus­trial do cinema alemão se põe em andamento, sobretudo através de medidas governamentais de auxílio à pro­dução e à reestruturação dos estúdios (com a criação da “Uníversum Filme Aktiengesellschaft”, mais conhecida por “UFA”). Acabada a guer­ra, com o país arruinado, e desfeitos (ou adiados) os sonhos, o cinema aparece para os alemães como uma forma de recon­quista do crédito perdido no exterior e da auto-confiança nos valores eternos da saga germânica. Os filmes de grande espec­táculo, de tradição italiana, estiveram então em moda e aí se revela Ernst Lubitsch. “O Gabinete do Dr. Cagliari” é de 1920. Robert Wiene, o seu autor, associa o cinema a formas de expres­são teatrais, sobretudo á escola de Max Reinhardt (director do Deutscher Theatre). O cinema começara a atrair os intelectuais de vanguarda e, entre 1920 e 1930, vamos assistir ao desenrolar do seu período áureo. “Expressionista”, “caligarista”, o cinema joga com elementos essencialmente teatrais, como o cenário, a ilumi­nação, o tipo de representação do actor... O espírito alemão res­surge. Wagner, os Nibelungos, Nietzsche estão presentes por detrás de obras como “O Golem” (Wegener), “Nosferatu, O Vam­piro”, “O Último dos Homens”, “Tartufo” ou “Fausto” (Murnau), “As Três Lâmpadas”, “O Doutor Mabuse”, “Os Niebe­lungos”, “Metrópolis”, “Os Espiões”, “Uma Mulher na Lua” (Fritz Lang), “O Museu das Máscaras de Cera” (Leni), “Rua sem Sol”, “Três Páginas de um Jornal”, “Os 4 de Infantaria”, “Ópera de Três Vinténs” ou “Tragédia a Mina” (Pabst), “Variedades” (Dupont), “O Canto do Prisioneira” (May), “O Anjo Azul” (Sterberg), etc.
A partir de 1924 será, porém, de referir, simultaneamente com o desenvolvimento do expressionismo, uma nova corrente, conhecida por “Kammerspiel”, que irá marcar a sobrevivência de uma raiz social e realista, ao longo de todo o cinema germânico (veja-se, sobre este aspecto, o volume de Francis Courtade, Ray­monde Borde e Freddie Buache, “Le Cinema Realiste Allemand”, ed. Serdoc). Pondo de parte os pesadelos fantásticos e a ameaça de monstros sobrehumanos, o “Kammerspiel” chama a atenção para pequenos ambientes fechados, zonas de enclausuramento, ana­lisados de um ponto de vista psicológico. São exemplos desta corrente “Rail” e “A Noite de São Silvestre”, ambos de Lupu Pick, ou “A Rua”, de Paul Grune. Aliás, a partir de certa altura, o expressio­nismo e o “Kammerspiel” parecem conjugar-se, aparecendo obras que denunciam uma influência de ambos os movimentos, caso de “Variedades”, “O Último dos Homens”, “Rua sem Sol” ou esse brilhante “Anjo Azul”...
Enquanto a República de Weímar deixa à deriva os alemães, a arte aparece como única forma de resistência à inflação, à miséria, à prostituição, ao desemprego. À revolta do alemão con­tra os Deuses, segue-se a revolta contra o Mal, enquanto enti­dade indefinível, indecifrável, metafísica. O sonho e o pesadelo, o lirismo e o macabro reaparecem como armas de defesa, projécteis de alerta. O cinema atravessa uma das épocas gloriosas do fantástico. Os terrores nascem do nada, de monstros ignotos, de presenças não localizáveis, de tiranos dementes, de cientistas loucos, de dragões mitológicos...
A partir de meados de 30, com a ascensão do nacional-socialismo, o cinema de raiz expressionista cede o lugar a uma produção oficial que enaltece a raça eleita, que difunde as máxi­mas do nazismo, que orienta as perseguições a minorias, que glorifica as virtudes militaristas de um povo “nascido para o Impé­rio”. “O Triunfo da Vontade” e “Os Deuses do Estádio” (de Leni Riefenshal), “O Jovem Hitleriano Quex” (Steinhoff), “O Judeu Suss” (Veit Harlon) são alguns dos muitos títulos possíveis de citar na enu­meração de uma cinematografia de inspiração nazi.
O fim da Segunda Guerra Mundial transporta consigo a desilusão, o desespero, de novo as ruínas, de novo a fome, a miséria, o desemprego, a inflação. A Alemanha perde as ilusões e em compensação é invadida por planos de reconstrução que representam uma hipoteca aos vencedores. Os americanos insta­lam-se. O cinema passa a ser algumas comédias sentimentais, meia dúzia de reconstituições ditas históricas, melodramas desviacionistas... Certos cineastas procuram manter a dignidade. São eles Staudte (“Os Assassinos Estão Entre Nós”, “Serenata de Canhões”), Kautner (“O General do Diabo”, “A Última Ponte”, “Nem Tambores, Nem Trompetas”), Siodmak (“Os Ratos”, “Os SS Atacam de Noite”), May (“08/15”), Pabst (“O Fim de Hitler”). Muitos, exilados durante o período hitleriano, não regressam mais. Outros, como Lang, voltam para relembrarem avisos: “O Diabólico Dr. Mabuse”. Entretanto, os anos 50 passam penosamente. O cinema alemão é um vazio inqualificável. As revelações mais ou menos jovens são escassas. O caso de Rolf Thiele, ainda que académico e por vezes enfadonho, é quase único. Dele haverá a referir: “Rosemary entre as Homens” (1958), “Lulu” (1962), “Das Schwarzweissrote Himmelbett” (1963), “Tónio Kro­ger” (1964), e “Walsungenblut” (1965). Outros nomes revelados: Bernard Wicki, em quem se chegou a depositar grandes esperan­ças, com “A Ponte” (1959) ou “O Milagre do Malaquias” (1960), Michael Pfleghar com “O Agente Secreto 007” (1965), curiosa sátira aos filmes de espionagem, e Bel Ami 2000 (1966), Georg Tressler (sobretudo “Endstation Liebe”), Herbert Vesely, de formação literá­ria e evidente pretensionismo formal, de quem serão de salientar algumas médias metragens: “Nicht Mehr Fliehen” (1954), “Und die Kinder Spielen so Cem Soldaten” (1961), “An Diesen Abensen” (1962), etc., e também Ottomar Dommick e Ferninand Khitti, o pri­meiro, neurologista, que realizou “Jonas” (1960) e “Ohne Datum” (1962), o segundo, considerado um dos mais importantes realiza­dores de um certo tipo de cinema experimental, sendo autor de “A Estrada Paralela” (1961), “Auf Geth’s” (1955), “Fogo nas Margens do Ródano” (1956) e “A Banda Mágica” (1959), todos eles importantes documentos cinematográficos, no dizer de Francis Courta­de.
Em inícios da década de 60, o milagre económico alemão começa a demonstrar o falência dos princípios porque se nortea­ra. A indústria cinematográfica - no caso, o exemplo que mais interessa aqui referir - tropeçara definitivamente e caíra nas armadilhas que ela própria criara. Parecendo renascer entre 1950 e 1958 (o número de salas passara de 4000 para 7000), afun­dava-se agora de forma calamitosa e irreversível nos quadros de uma indústria tradicional. Se, em 1958, a Alemanha Federal produzira 98 filmes, em 1962 este número decrescera para 43. Nou­tros campos, o ambiente não era mais optimista: o número de espectadores baixava anualmente de forma vertiginoso (40%, em cinco anos), as receitas caíram céleres (em quatro anos de 173 para 78 milhões de marcos), o número de salas que fechavam as por­tas aumentava (300 por ano), as casas produtoras reduziam-se em 50%.
Em 28 de Fevereiro de 1962, durante as VII Jornadas da Curta Metragem, em Oberhausen, vinte e seis personalidades ligadas ao cinema alemão subscreviam uma declaração de prin­cípios, que viria a ser conhecida pelo “Manifesto de Oberhausen”, e que constituiria um marco decisivo no futuro da cinematografia germânica. Dizia o manifesto:
“O fracasso do cinema convencional alemão desloca final­mente a base económica para uma das posições intelectuais geralmente desconsideradas. Deste modo, o Novo Cinema dis­põe de possibilidades de conseguir vitalizar-se.
“Como noutros países, também na Alemanha a curta-metra­gem se converteu em escola e campo experimental para a longa-metragem.
“Manifestamos a nossa pretensão de criar um novo cinema alemão. Este novo cinema exige novas liberdades. Liberdade em relação às influências do comércio. Liberdade em relação aos convencionalismos usuais do ramo. Liberdade em relação à tutela de certos interesses.
“Temos, relativamente à produção do novo cinema alemão, ideias concretas de tipo intelectual, formal e económico. Estamos dispostos a suportar riscos económicos em comum. O velho cinema está morto. Creiamos no novo”.
Entre os vinte e seis signatários, alguns nomes que se torna­riam depois primeiras figuras desse novo cinema: Alexander Klu­ge, Franz-Josef Spieker, Herbert Vesely, Ferdinand Khiti, Edgar Reitz, Peter Shamoni, Heinz Tichawsky, como realizadores, e Bob Howver, Hans-Jurgen Pohland e Hora Senft, como produtores.
Um ano depois, os signatários de Oberhausen tentam criar uma Fundação do Novo Cinema Alemão, mas a tentativa não se concretiza. O Estado respondeu concedendo prémios de 200000 marcos a um certo número de argumentos que lhe foram dirigidos (muitos dos quais nunca mais realizados). O espírito de Ober­hausen não desapareceria, mas três ou quatro anos se irão pas­sar até se concretizar de forma palpável.
Entretanto, em Fevereiro de 1965, o Ministério do Interior do governo de Bona, investe 5 milhões de marcos na criação do “Kuratoriun Junger Deutscher Film”, importância essa dividida em subvenções de 300000 marcos cada. Alexandre Kluge seria o pri­meiro beneficiado e daí nasceria “Anita G”.
Em 1966, cria-se em Berlim uma Academia de Cinema e Televisão (1 de Janeiro de 1966) e, em Ulm, o Instituto de Reali­zação Cinematográfica. Ainda em 1966, um grupo de cineastas funda uma cooperativa cuja intenção primordial era retomar e desenvolver o espírito do “Manifesto de Oberhausen”. Seria tam­bém em 1966 que, no Festival de Cannes, o cinema novo alemão faria a sua apresentação oficial, projectando três obras decisivas: “Der Junge Torless”, de Volker Schlondorff, “Es”, de Ulrich Shamoni e “Nicht Versohnt”, de Jean Marie Straub. Em Veneza, por seu turno, surgiria “Abschield von Gestem” (Anita G,), de Alexander Kluge.
Volker Schlondorff estagiara alguns anos em França, como assistente de Resnais, Malle e Jean Pierre Melville. Na Alemanha, estreara-se em 1960, com uma curta-metragem (“Wen Kummert’s”) e o seu primeiro filme de fundo adaptava uma novela de Robert Musil, “O Jovem Torless”, cuja acção decorre nos anos 30. Num colégio de rapazes, um microcosmo que irá explicar a génese do nazismo. Neste universo concentracionário onde se movem ele­mentos de uma média e alta burguesia (professores e alunos, filhos das “melhores” famílias alemãs), iremos encontrar os estig­mas que caracterizariam o nacional-socialismo.
Torless, “espectador” desde a sua entrada no colégio (uma longa panorâmica, ao longo das casas da aldeia permite-nos, a nós e a ele, descobrir um outro mundo, coexistindo em simultâneo com o internato), irá assistir, aristocraticamente, a uma autêntica escalada de violência e perversidade que culminará em cenas do maior sadismo, impostas em nome de uma maioria privilegiada e dominadora, sobre minorias desarmadas, como é caso de Basi­ni, um colega de origem judaico, que é apanhado a roubar e sobre o qual se exercem, posteriormente, as mais cruéis e degra­dantes “experiências”.
Ao lado de Beineberg e de Reiting (mentor teórico do nacio­nal-socialismo e sua prática), Torless surge-nos como o intelectual aristocrata que tenta não “sujar as mãos”, mantendo-se um pouco alheio a toda a tragédia a que vai assistindo, mais ou menos impávido. Da sua permanência no colégio, Torless recor­dará unicamente a sua passagem por casa de Bozena, uma mar­ginal. Como muitos dos “bons” intelectuais de origem burguesa, Torless descobriu a brutalidade do nazismo, teve consciência do seu perigo e, como solução para o seu caso pessoal, emigra.
Schlondorff, para além de analisar uma situação específica que iria justificar o aparecimento do nazismo, não deixa de apon­tar o comportamento demissionàrio de grande parte de intelec­tualidade alemã que preferiu a fuga ao confronto directo. Um belo filme, de tons cinzentos, de atmosfera pesada, de prenúncios trágicos.
Ulrich Schamoni, um dos quatro irmãos Schamoni, filho de realizador, operador e montador Vitor Shamoni, afirmara-se como escritor e documentarista, antes de se estrear no filme de fundo “Es” (“Isto Aconteceu”) prenuncia uma outra via do novo cinema alemão, interessando-se pelos problemas da juventude contemporânea e as dificuldades que esta encontra em prosseguir um caminho livre, numa sociedade como a alemã, sociedade da abundância e do consumo, onde muitos problemas básicos se encontram por resolver. Aqui um casal de jovens que vivem jun­tos, ainda que não estejam casados. Ele é empregado numa agência de imobiliárias, ela desenhadora técnica. Tudo corre bem até que um dia a rapariga se descobre grávida. A criança aparece-lhe como um ser não desejado naquela altura da sua vida e, tomando sozinha a grave resolução, aborta. Num dos últi­mos planos do filme, a jovem revela o seu acto ao companheiro e sobre o futuro do casal mantém-se uma incógnita indecifrável. Ulrich Schamoni levanta assim, de uma assentada, diversos pro­blemas de grande acuidade no interior das sociedades ociden­tais, desde a situação da mulher, à legitimidade do aborto, o tipo de relações entre várias gerações, o clima de “boom” económico que a Alemanha Ocidental reflectia, o tipo de mentalidade urbana dos alemães de classe média, a hipocrisia nas relações entre sexos, etc. “Isto Aconteceu” é efectivamente um retrato cin­zento de uma civilização em crise.
Alexander Kluge era, seguramente, dos jovens cineastas ale­mães revelados em meados de 60, aquele que possuía maior bagagem cultural como suporte para o exercício de uma prática cinematográfica. Advogado por profissão, escritor, documentaris­ta, Kluge é, no dizer de Marcel Martin, “o melhor representante da nova geração alemã”.
“Abschield Von Gestem” (Anita G) abre com uma epígrafe que a define (situa)): “Nenhum abismo nos separa de ontem. Apenas a situação mudou”. Com esta citação inicia Kluge o seu inquérito sobre uma mulher: Anita G. Do seu passado, pouco se sabe. Judia por nascimento, filha de um rico industrial, perseguida e expatriada durante o III Reich, deixa Leipzig em 1957 para entrar na Alemanha Ocidental. Aqui vive de pequenos expedientes, até ser apanhada a roubar um vestido. Com o julgamento, inicia-se o processo Anita G. Os espectadores serão testemunhas chama­das a intervir no último momento. “Todos são culpados de tudo. Se cada um soubesse, a Terra poderia ser um paraíso”. Somos portanto nós, público, que iremos julgar Anita G., através dos episódios fragmentados que irão reconstituir um rosto, desenhar uma figura.
“Tal como em Resnais, também em Kluge o passado adquire um peso condicionante de acções e gestos. Será ele, filtrado pela memória (que se encontra sempre presente sob a forma de foto­grafias, sons, reminiscências várias) que estilhaçará o presente, desfigurando coisas e pessoas, tornando-as alheias e distantes, inacessíveis e obscuras. Perdida numa realidade que não enten­de, nem abarca. Anita G. pretende integrar-se, ajustar-se, tornar­se peça oleada da engrenagem. Um cartaz anuncia: “Eu sei que um dia haverá um milagre”. O milagre, porém, esgueira-se por entre os dedos desajeitados de Anita. Não será o seu o “milagre alemão”.
Retrato de uma mulher, “Anita G.” é, sobretudo, o retrato “ro­bot” de uma sociedade, feito através de alguns dos seus aspec­tos dominantes. Os polos enunciam-se ao longo da obra: um administrador de uma companhia de discos de ensino de línguas; um alto funcionário do Ministério de Negócios Culturais que vive com Anita e a pretende integrar - educar? - pela cultura (Brecht, Verdi...); um professor de Sociologia; um advogado...
Do processo a “Anita G.”, passa-se ao processo a uma socie­dade. Por caminhos que passarão certamente por Brecht.
Um cinema feito de ironia amarga e cruel: um cinema feito e refeito, estilhaçado pela dúvida, pela imagem passada, pelo ter­ror cristalizado na pele. Anita G., geograficamente perdido no interior de uma grande metrópole, vagueando por ruas e pontes, perse­guida e encurralada. Um tom de crónica. E também das vinte e quatro verdades por segundo de que falou Godard. Aqui e ali uma herança que se não nega: o expressionismo. Kluge utiliza todos as processos, estiola toda a gramática, pulveriza as regras e constrói, uma admirável obra-prima da cinematografia moderna; Tudo isto ao som das valsas e tangos: um lirismo repassado de amargura, um olhar que nos fixa interrogador: “Todos são culpa­dos de tudo”. Nós somos o processo “Anita G.”
Entramos agora num dos casos mais polémicos do cinema contemporâneo. Chegou a altura de falar de Jean-Marie Straub, francês de nascimento que emigrou para a Alemanha, fugindo a uma possível mobilização com des­tino à Argélia. Straub estreia-se no cinema com “Machorka-Muff”, adaptação de uma novela de Heínrich Boll. Esta curta-metragem, datada de 1963, é uma sátira à sobrevivência nazi na Alemanha de hoje, analisada nos seus múltiplos aspectos, desde o rearma­mento à militarização, passando pelo “regresso triunfal de anti­gos oficiais nazis a postos-chave da Alemanha de Bona (ministé­rios e ‘Bundeswehr’ em particular)” (Courtade). “Machorka –Muff” é, efectivamente, uma obra agreste e contundente, o que vai em parte buscar à novela de BoIl, a que a narrativa sincopado e aparentemente caótica de Straub, oferece meia dúzia de aponta­mentos curiosos. Foi ainda em Heinrich Boll que Straub foi encon­trar inspiração para sua primeira longa-metragem: “Nicht Versohnt” (1969). O próprio Straub define as suas obras: “Machorka Muff” é a história de uma violação (a violação de um país, ao qual re­impuseram um exército); “Nicht Versohnt” é a história de uma frus­tração (frustração... de um povo que não se libertou do fascis­mo)”.
Em “Nicht Versohnt” passam três gerações de arquitectos ale­mães, da família Fahmel, que, através de vários episódios que se interpenetram no tempo e no espaço (tão depressa nos encontra­mos em 1934, em 1914 ou em 1954, como nas margens do Reno ou nas salas do hotel “Prinz Henrich”), nos mostram a sobrevivência de uma mentalidade nazi e das consequências de um passado ainda próximo num presente de horizontes ameaçadores. De qualquer forma, também aqui Straub, procurando furtar-se a toda e qualquer possível assimilação dita “comercial”, acaba por exe­cutar uma obra extremamente hermética, de difícil leitura e de penetração cultural e social bastante discutível. O filme viria a ser pateado e incompreendido por quase todo o público, aquando da sua estreia, bem assim como saudado por alguns sectores da crítica alemã (e internacional, sobretudo francesa), que nela viram (de alguma forma justificadamente) um sinal de saudável ruptura com um passado mercantil e demissionário do cinema germânico.

DECLARAÇÃO DE MANHEIM

Estas foram, portanto, as quatro obras que decisivamente definiram e delimitaram o nascimento do “novo cinema alemão” e assinalaram um profundo volte face na indústria do país. A partir de 1966, todos os anos surgiram várias obras que sustentarem e desenvolveram as premissas apontadas por Schamoni, Schlon­dorff, Straub ou Kluge. Não com as características de um “movi­mento” coerente, estética ou politicamente, mas como uma adaptação local do fenómeno de “nouvelle vague” francesa, isto é, como um grupo heterogéneo de jovens cineastas que, subitamen­te, e em bloco, conseguem ascender a uma situação que lhes permite realizar o seu primeiro filme de fundo e, daí em diante, prosseguir ou abandonar uma carreira de cineasta, com um mínimo de liberdade garantida e condições de sobrevivência asseguradas.
A caminhada não foi, todavia, isenta de percalços. Em Janeiro de 1968, por exemplo, entra em vigor, na República Fede­ral, uma nova “lei de auxílio ao cinema” que revolta grande número de cineastas. O princípio, defendido na nova legislação (princípio esse defendido há vários anos pelos deputados cristão-democratas Berthold Martin e Hans Toussaint) é o seguinte, segundo Courtade: “10 cêntimos de aumento em cada bilhete de cinema alimentariam um fundo, do qual 1/3 era destinado à modernização das salas. O auxílio ao produtor (250000 marcos) dominuia grandemente e colocava os realizadores numa mani­festa posição de dependência”. Ou seja: para poder contar com o auxilio de 250000 marcos, o produtor teria de indicar um “filme referência”, produzido por si, anteriormente, e que, em dois anos de exploração no mercado alemão, tivesse de receitas pelo menos 500000 marcos. Os jovens cineastas rebelaram-se - não tanto por se terem sentido atingidos pela medida (a grande maio­ria dos seus filmes realizaram receitas muito superiores às exigi­das), mas pelo que consideravam ser uma declaração nítida de dependência. As medidas foram tidas como “reaccionárias, tanto de um ponto de vista cultural, como económico” e, mesmo num plano político, uma cláusula da nova lei iria levantar enorme dis­cussão: “o auxilio só seria concedido aos filmes que não fossem contra o espírito da Constituição e das leis, ou susceptíveis de colidir com as convicções morais e religiosas do cidadão”. E, pois, neste sentido que se terá de compreender a publicação de uma “Declaração”, aparecida aquando do festival de Manheim (em Setembro de 1967, dois meses antes da publicação da lei), e assinada, entre outros, por Josef Von Sternberg (como presi­dente do Júri), Alexander Kluge, Edgar Reitz, Hans Rolf Strobel, Heinz Tichawsky, etc. Na “Declaração de Manheim”, podia ler-se:
“O futuro de uma economia só pode ser julgada em função da promoção dos jovens. Nenhuma economia deve ser um clube fechado tendo as pessoas já o seu lugar sentado. O projecto da lei de auxilio supõe, de uma forma unilateral, grandes casas de distribuição e de produção. Não faz nenhum caso da cultura pelo filme, nem da nova geração com os seus pequenos orçamentas”.
Aplicada a legislação, logo se confirmaram muitos dos temo­res dos signatários deste declaração. Ao legislador interessara uma indústria, não um fenómeno cultural. Dois anos depois, a revista “Film” afirmava: “A lei fixava, como finalidade, elevar a qualidade do cinema alemão em vastos campos. A lei faltou ao seu dever principal. Entre os primeiros vinte e cinco títulos financiados, é ver­dade que se encontram “Cavaleiro Bravo, S.A.R.L.”, “Refeições” e “Tatuagem”, mas a maior parte dos filmes, compõe-se de “Comis­sário X”... e semelhantes películas abertamente comerciais.
Mas esta legislação foi abolida, em resultado de várias “démarches” políticas e sindicais que os cineastas alemães empreen­deram com êxito.
As dificuldades continuaram, é certo, mas os cineastas da geração que surge no cinema em meados de 60 - muitos deles devidamente reconhecidos internacionalmente, como autores de uma importância incontroversa e mesmo com algum êxito comercial - romperam definitivamente com o marasmo da produção alemã ocidental que se colocou, por essa altura, entre as mais interessantes e sur­preendentes de todo o mundo.


2. WERNER HERZOG
A obra de Werner Herzog é incontestavelmente uma das mais pessoais e originais do cinema contemporâneo. Se o que define um autor e a sinceridade do seu trabalho é a imperiosa necessidade de dizer algo, de transmitir obsessões e fantasmas, preocupações e desejos, então Werner Herzog é definitivamente um dos mais rigorosos e criteriosos cineastas da história do cine­ma. A sua trajectória é das mais apaixonantes (e apaixonadas), desde os seus tempos de simples cinéfilo até ao seu mais recente trabalho. Nem concessões de qualquer espécie, produzindo, escrevendo e realizando a totalidade dos seus filmes, com equi­pas que se vão mantendo de título para título, numa constante de solidariedade e cumplicidade, Werner Herzog é um realizador alemão, testemunho de toda uma tradição cultural que não des­mente e que reafirma a cada nova resposta.
Werner Herzog nasceu a 5 de Setembro de 1942, numa pequena aldeia da Alta Baviera. Os tempos eram de guerra, a aldeia encontrava-se quase abandonada. Herzog já não tinha pai, a mãe educa-o de uma forma liberal, como ele própria relembra. Frequenta o liceu, depois estuda Literatura, História e Teatro, primeiramente em Munique, depois em Pitsburg, nos EUA. A partir de 1962 vamos já encontrá-lo envolvido pelo cinema, rodando as primeiras curtas-metragens, enquanto inicia a sua errância pelo mundo. As viagens serão, aliás, ele mesmo o afir­ma, a sua obsessão primeira, numa tentativa desesperada de encontrar um lugar utópico, deambulando pelo desconhecido, à procura de sensações limites que o conduzam ao conhecimento da verdade e de si próprio. “O Que Eu Sou, São Os Meus Filmes. Não há segredos pessoais que um filme não descubra completamente. Ao ver um filme de um autor, este é sempre surpreendido de calças na mão”, diz Herzog, que completa a ideia: “Nos últi­mos quinze anos, fazer filmes é para mim a única forma de esta­belecer uma relação com as pessoas”.
Aos 18 anos viaja até ao Sudão, seguindo-se depois estadias em Inglaterra, nos EUA (onde trabalha para uma cadeia de tele­visão, depois para a NASA, documentando estudos de novos sis­temas de propulsão para foguetões), depois ainda a África, o México, as Canárias, o Peru, toda a Europa. Quando Lotte Eisner, a grande ensaísta e estudiosa do cinema expressionista alemão, se encontra gravemente doente em França, Herzog sai de Muni­que a pé e dirige-se a Paris, no cumprimento de uma promessa. Quando, no Verão de 1976, os jornais falam de um vulcão em França, “La Soufriére”, que ameaça explodir e soterrar algumas aldeias que entretanto haviam sido evacuadas, Herzog e uma pequena e destemida equipa de filmagem, dirige-se para aí. O seu propósito confessado é testemunhar e arquivar os últimos dias dessa aldeia fantasma, que dois ou três habitantes teimam em não abandonar, mas bem no intimo, é o desafio que o tenta. A proximidade do perigo, sentindo rondar a morte, aproximar-se de uma situação limite que roça o paroxísmo. Essa terá sido sem­pre a sua intenção ao eleger casos extremos para sobre eles cen­trar a atenção da sua câmara. A guerra e a loucura de “Sinais de Vida”; o paraíso terrestre, a Idade do Ouro da Terra, em “Fato Morgana”; um universo apenas povoado por anões, em “Também os Anões Começam por Baixo”; a total incomunicabilidade, em “Terra da Silêncio e da Escuridão”; a demagogia e o poder, em “Aguirre, o Aventureiro”; o caso de um menino-selvagem, em “O Enigma de Kasper Hauser”; a possível erupção de um vulcão em “La Soufriére”; o segredo ae vidro-rubi em “Coração de Vidro”; a patético emigração de Bruno S. em “A Canção de Bruno S.”, a que se deverá juntar “Fitzcarraldo”, um filme que roda durante dois anos na selva da Amazónia, nas piores condições que se possa imaginar, correndo os maiores riscos, desafiando a natureza e o perigo a cada novo plano.
Para Herzog o cinema só pode ser efabulação, ficção, cria­ção interior, projecção de si próprio. Para ele, “o cinema verdade não revela a verdade, mas a sua aparência. Uma mentira cine­matográfica pode revelar muito melhor a essência de um momen­to, de uma situação, de uma forma de loucura individual. Eu invento ficções que servem a realidade a um nível mais profundo do que o cinema-verdade, que só apanha a forma mais primitiva e mais periférica da verdade”.
Estudos humanos em ambientes fechados; uma evidente pro­pensão para casos-limites, rondando o comportamento já pato­lógico; o recurso a grupos humanos limitados, minorias normal­mente marginalizadas por deficiências diversas; uma constante influência da paisagem e dos cenários naturais sobre o compor­tamento das personagens; um gosto quase mórbido, mas nunca gratuito, pela crueldade, pelo grotesco, pela violência, pela anormalidade; uma forma subterrânea, metafórica, de falar de si e do universo que o rodeio; o drama da incomunicabilidade e a luta titânica pela sua superação, eis alguns dos temas básicos deste fascinante autor, herdeiro directo de algumas das mais lídimas características do expressionismo alemão dos anos 20.

SINAIS DE VIDA

Creta, já nos últimos tempos da II Guerra Mundial. O sol­dado Stroszek é ferido numa emboscada e internado durante alguns dias num hospital, no qual conhece uma grega, Nora, com quem acaba por casar. Já em período de convalescença é enviado para uma ilha, Kos, no Dodecaneso, ilha aparentemente afastada dos conflitos bélicos. Acompanhado pela mulher e ainda por dois camaradas, Meinhard e Decker, igualmente saí­dos no hospital, Stroszek é incumbido de guardar um depósito de munições abandonado que se encontra num velho castelo vene­ziano, junto ao porto de Kos.
Isolados no castelo, os seus quatro habitantes procuram tor­nar a existência o mais cómoda possível, desfrutando uma inac­tividade quase total, intercortada por pequenos afazeres que mais parecem passatempos: pintar portas, depenar galinhas, construção de imaginosas gerigonças paro capturar baratas, decifração de velhas inscrições latinas, etc. Um pequeno paraíso, uma ilha de paz, onde nunca se combateu, conforme somos informados pelo comentador do filme.
A calma é, porém, ilusória; a inactividade paralisadora. Pas­sam-se duas semanas sem que nada aconteça. A monotonia é quebrada pela aparição de um cigano, com quem é impossível comunicar. Também com as crianças do porto é difícil estabelecer diálogo, nas raras descidas dos quatro ocupantes do castelo à vila.
Entretanto, Meinhard interessa-se vivamente pela fabricação de foguetes, numa aparente luta contra a apatia circundante. É também ele quem mais vezes desce até à vila ou até à costa, à procura de peixe, num mar onde a pesca é quase nula.
O isolamento vai trazendo as suas consequências: Stroszek anda cada vez mais perturbado. Desce mais uma vez à vila, onde encontra um inquietante pianista, cuja música não o acalma. O seu superior hierárquico, apercebendo-se do evoluir dos aconte­cimentos, envia-o numa missão de reconhecimento, cuja finali­dade é unicamente distraí-lo. Durante a missão encontra uma casa, onde pára para beber e onde ouve uma criança tentar can­tar uma ária que o pai lhe pede para entoar. Mas também a criança não consegue articular os sons certos. O caso de Stros­zek agrava-se, sendo já incontroversos os sintomas de loucura.
Finalmente, expulsa os companheiros do castelo e tenta des­truir a povoação com os foguetes que ele próprio havia fabrica­do. Na primeira vaga de ataques consegue apenas matar um burro, além de espalhar o pânico entre a população e alertar a reduzida guarnição militar do porto que, a principio, julga tratar-se de um ataque de patriotas gregos. Mas o ataque de foguetes que parte do castelo em posse de Stroszek, prossegue, agora com resultados ainda mais insignificantes: uma cadeira queima­da.
Stroszek resiste durante dois dias, entricheira­do na sua posição, mantendo à distância os elementos que o rodeiam com a ameaça de fazer explodir o depósito de munições, caso alguém se aproximasse do castelo. Mas o cansaço vence-o, acabando dominado pelos seus camaradas, e de novo enviado para o hos­pital.
A solidão - uma das constantes do cinema de Herzog. Numa terra que não é a sua, Stroszek e os companheiros desco­brem a total incapacidade para a comunicação. A língua que se desconhece, a aridez inóspita da paisagem grega, a mulher com quem se casa e com quem se não pode falar, a disponibilidade de um tempo inútil, tudo isto conduzido a um acto aparentemente de loucura mas na realidade de esquizofrénico suicídio e, sobre­tudo de revolta: o bombardear da aldeia com os foguetes.
Longos planos com a câmara fixa - uma forma inquietante de abordar a solidão. A negro e branco, os traços inóspito da presença do homem num universo estranho. Um filme desequili­brado, seguramente, mas interessante, revelador de uma perso­nalidade sumamente curiosa.

FATA MORGANA

“Fato Morgana” não é uma película de estrutura tradicional, na medida em que recusa qualquer tipo de ficção e se entrega intei­ramente à elaboração cerrada de imagens e cores, de sons e rit­mos que mais se associam à criação do “poema”, do que à ela­boração do “romance”. “Um filme sobre a criação do mundo, o paraíso e a idade do ouro”, assim o define rapidamente Herzog. Um comentário, dito por Lotte Eisner (a maior autoridade sobre a cinema expressionista alemão), que começa: “Aqui se conta como o mundo jazia num silêncio completo, e flutuando numa calma profunda, balouçava, ermo e solitário. E esta é a primeira informação, o primeiro testemunho: não havia homens nem ani­mais, aves, peixes ou répteis; nem árvores, pedras, cavernas ou abismos, ervas ou arbustos, unicamente o céu”.
E o texto continua: “Por baixo da abóbada celeste, invisível era a face da Terra; só a mar se comprimia sossegado e era tudo. E não havia nenhum objecto que se tivesse podido formar, ou se notasse, movesse, corresse ou soasse no céu, pois era nada absoluto. Só a água, um mar imenso e tranquilo; não havia nada que não tivesse existido. Tudo era silêncio e calma na escu­ridão da noite”. Diz Herzog que as imagens de “Fata Morgana” acompanham a narração dos mitos da criação do mundo dos índios guatemaltecos do século XVI e se apoiam em comentários dispersos dos vanguardistas alemães de 1970.
Quais as imagens de “Fata Margana”? O filme encontra-se dividido em três partes: “A Criação”, “O Paraíso” e “A Idade do Ouro”. Inicia-se a descrição do primeiro tempo, “A Criação”: O filme começa com uma lenta chegada. Um avião que aterra na poeira do deserto. Aterragem que se repete oito vezes, enquanto a voz da narradora inicia a descrição dos primeiros momentos da criação, numa linguagem que nos relembra outros mitos, nomea­damente o da “Criação” cristã. Palmeiras cinzentas, despojos no meio do deserto, fuselagem de um avião, carcaças de animais, ressequidas, insistentemente focadas. Depois o deserto, os con­tornos das dunas, o céu, a areia de um cinzento pardo, a cor da noite, o sol, a imensidão das distâncias sem fim. A proximidade de um grupo de barracas. Crianças negras subnutridas, velhos, tudo cercado, abafado pelo presença constante do deserto. A narradora fala-nos do Criador e da Criação. A estrada serpenteia por entre dunas. Os subúrbios da cidade, as barrocas. Uma criança segura uma raposa no deserto, branca, diante da câma­ra. A música, de coro liturgico, transforma-se num “beat” ritma­do. A narração continua “Deus fez uma nova tentativa de Cria­ção”.
Segundo tempo: “O Paraíso”. Do interior de uma caverna, sai um árabe. Do rádio transistorizado, música de tango. “No Paraíso o prazer é obrigatório”. Como banda musical canções de Leonard Cohen “I love you in the Morning... Mary loved before us…” Um lagarto, preso nas mãos de um cientista alemão, que se lamenta: “Disponho apenas de 14 anos para saber como este lagarto pode sobreviver sob o sol ardente do deserto e encontrar sustento”. Um sol que sobe até aos 50 graus. No comentário: “No Paraíso as pessoas nascem já mortas”.
Um grupo humano: uma mulher branca ensina meia-dúzia de crianças negras a repetir: “A guerra relâmpago é uma loucura”. Longas panorâmicas sobre excrementos de uma indústria petro­lífero que suja a paisagem. Campos de concentração de mate­rial.
Na margem de um lago, um homem-rã explica que “a tarta­ruga tem barbatanas para se movimentar, uma boca para se ali­mentar e um ânus por onde tudo volta a sair”. Depois de obser­var atentamente o animal, o mergulhador volta a atirá-lo à água e lança-se ele própria de novo em sua perseguição. Prometeu, o mito. A narradora: “Enquanto tu dormes, Deus passeia doce­mente pela Terra com Maria.”
Finalmente, o terceiro tempo: “A Idade do Ouro”. Numa tarde de feira, uma pianista e um baterista tocam automatica­mente melodias espanholas, recomeçadas incessantemente. “Na Idade do Ouro, homem e mulher vivem harmoniosamente entre si”. Grinaldas de flores mortiças e um ambiente de festa moribun­da. Junto ao mar, palmeiras. Num deserto de terra negra, como um cenário de Beckett, grupos humanos tentando sair de covas onde se instalam. A “trágica visão” não tem fim. Homens que riem, outros que gesticulam. De novo o homem-rã: “A tartaruga tem uma cabeça para pensar
A viagem de “Fata Morgana” (miragem longínqua de um pas­sado, pesadelo que relembra a presença angustiante do homem sobre a Terra) termina com vários planas de crosta da Terra, res­sequida, gretada, rasgada.
Estruturando-se entre o pesadelo e o sonho, “Fata Morgana” é uma sucessão de imagens guiadas por uma narração que as imagens por vezes ilustram, quase sempre comentam, ora drama­ticamente (por oposição à descrição utópico das palavras) ou sar­casticamente (por desvio do seu significado). De novo a insistên­cia quase provocadora na utilização de planos de longa duração, ou repetidos inúmeras vezes. De novo a impotência do homem perante a paisagem agreste que é, simultaneamente, desafio e derrota. E novo desafio e derrota. E novo desafio. Uma nova constante que iremos encontrar, acentuando-se, em filmes posteriores: a presença do animal. Em “Sinais de Vida” são as baratas, as galinhas depenadas, é um burro morto durante um tiroteio de foguetes. Em “Fata Morgada”, filme rodado no Sul do Sahara, surgem as raposas do deserto, os camelos, a tartaruga, todos eles assegurando um importante papel no peso simbólico e metafórico do significada final dos obras. A perversidade, o horror, a crueldade, na boa tradição dos surrealistas, de um Buñuel, por exemplo. Cuja influência Herzog não renega...

TAMBÉM OS ANÕES COMEÇAM POR BAIXO

Rodado em Lanzarote, uma ilha das Canárias, numa região visivelmente vulcânica, “Também os Anões Começaram por Baixo”, é seguramente um dos mais inquietantes e polémicas filmes de Herzog.
Trata-se de uma parábola (toda o cinema de Herzog parece, aliás, inserir-se num processo simbólico, com muitas característi­cas comuns a todas as suas obras), interpretada unicamente por 27 anões, num cenário “normal” (isto é: monstruosamente des­proporcionado para os seus habitantes). A “história” é relativa­mente fácil de resumir, mas impossível de descrever: num asilo (casa de correcção?), durante a ausência do director, grande parte dos internadas revolta-se contra o encarregado que os vigia, encarregado esse que como eles é anão. Este consegue entricheirar-se no escritório, juntamente com um refém, e procura dissuadir os revoltosos dos seus intentos. Entretanto, cá fora, as reclusos dão livre curso à sua revolta, apedrejando o escritório do vigilante, queimando uma palmeira do director, destruindo auto­móveis e motos, partindo louça, atirando comida uns aos outras, rasgando, desordenando, destruindo...
O vigilante avisa-os de que, se não cederem, ele acabará por liquidar o refém. O que acaba por fazer, pondo fim a essa revolta selvática. Num último plano da filme, um anão ri demoradamente, enquanto à sua frente, um camelo, com as patas dian­teiras dobradas pelas joelhos, faz repetidos e improfícuos, esfor­ços para se erguer.
Como obra original e polémica, “Também as Anões Começa­ram por Baixo” é indubitavelmente apaixonante. De uma cruelda­de quase insustentável. De uma violência que não nos lembra ver muitas vezes em imagens. Nesta parábola tremenda são novamente os animais as mais visados. As galinhas: uma delas debicando um rato morta; outra, manca, a ser perseguida e quase devorada viva; o camelo, que atrás se refere; o macaco que ocupa o lugar de Crista numa procissão; finalmente, uma das mais violentas cenas da história do cinema: uma porca que dois anões cegos matam à paulada e depois cavalgam, enquanto as crias, ignorando a morte da mãe, permanecem agarradas às suas tetas, chupando-lhe o leite. Tudo isto, inscre­vendo-se num universo “monstruoso”, de cenários ermos e inós­pitas paisagens. Num filme onde se mantém a dificuldade de expressão e de movimentas dos anões. Numa obra onde a violência das acções humanas é constante.
Mas, se “Também os Anões Começaram por Baixo” nos parece apaixonante como proposta, já muito discutível poderá ser a sua interpretação. Senão, vejamos: se aquele asilo abando­nado pelo director (Deus? Existe na obra um ou outro elemento que nos pode induzir numa interpretação deste tipo: por exemplo a cama do director, onde dois anões irão tentar ter relações, é obviamente pertença de um ser que os ultrapassa em estatura) prefigurar o mundo, e a revolta contra uma ordem estabelecida (qualquer ordem estabelecida, visto que o filme não nos oferece qualquer tipo de referência em relação à “ordem” contestada), obvia­mente se poderá concluir pela selvática inutilidade desta revolta anárquico, no que o filme se aproximará perigosamente das propostas de uma ideologia de tonalidade germânica, legitimando processos de manutenção de ordem contra a barbárie. Com o agravante de que, sem tornar plasticamente sedutora a violência e a crueldade, existe contudo em “Também os Anões Começaram por Baixo” algo de fascinante, nesse jogo de fim de mundo, onde o caos sucede à ordem.
Outro aspecto curioso de referir: aquando da revolta dentro do asilo, os anões distorcem a utilidade prática dos objectos e das máquinas postas ao seu serviço: um carro é colocado em cir­culos, toureado por uns, apedrejado por outros; a louça, que fun­ciona coma arma de arremesso; a comida, que se despreza como um brinquedo, etc., tudo isto conduzindo a uma situação limite, caó­tica e insustentável, tornando “necessária” qualquer forma de reacção disciplinadora. Estaria nas intenções de Herzog esta lei­tura? Na melhor das hipóteses, porém, o pessimismo é ainda assim a ideia central, definido nas imagens finais, nessa esfor­çada - e inútil - tentativa do camelo que procura erguer-se, sem o conseguir, perante o riso convulsivo de um anão.
Richard Goud, em “The Guardian”, refere um curioso aspecto desta obra: “Todos os filmes são um microcosmos, mas Herzog teve a brilhante ideia de nos dar literalmente um micro­cosmos; toda a vida humana, por muito infeliz e desoladora que seja, se encontra ali, escrita em minúsculas. No seu intelectua­lismo progressivo, na sua coragem, e mesmo na desprezível obscenidade, trata-se de um soco bem dado, no seio de uma certa tradição da arte nórdica. Grotesco, desagradável, repulsivo até: tal como as pinturas de Bosch e Grunwald, ele é testemunho de um ponto de vista da vida humana que nós corremos o perigo de ignorar”.
Falar de Bosch e Grunewald, a propósito de “Também os Anões Começaram por Baixo”, eis um paralelismo interessante, a justificar uma atenção redobrada á obra de Herzog.

A TERRA DO SILÊNCIO E DA ESCURIDÃO

“Quando ainda era criança, e podia ver e ouvir, assisti a sal­tos de esqui, e essa imagem vem-me sempre ao pensamento. Quando esses homens pairavam no ar, eu olhava atentamente as suas faces. Gostaria que você também as pudesse ver”. Com estas palavras de Fini Straubinger inicia-se “Terra do Silêncio e da Escuridão”. Desta feita a sua atenção para o mundo dos cegos e dos surdas.
O filme acompanha Fini Straubinger, uma mulher de 56 anos, que aos 16 perdeu a vista e dois anos mais tarde ficou completamente surda. Primeiramente é a sua existência quotidiana e a de várias outras pessoas em situação idêntica que a obra testemunha. Depois traça-se rapidamente a evolução da sua doença, a queda na escada, os sintomas sem­pre crescente da perda das suas faculdades, um longo período de desânimo e inação que, mais tarde, vem a ser superado. Fini Straubinger consegue triunfar das condições adversas em que vivia, ultrapassando a dificuldade de comunicação, o isolamento, a descrença. Vive agora na Baviera, trabalha como visitadora de outros seus semelhantes, lutando para que cada um possa ver melhorada a sua situação.
Através das deambulações de Fini Straubinger, vamos encontrando vários casos de pessoas desfavoravelmente integra­das na sociedade: Elsie Faher, surda e cega, a quem colocaram numa clínica psiquiátrica, embora como é óbvio o seu lugar não devesse ser ali; o jovem Harald, surdo e cego de nascença, inter­nado num hospital especializado, que beneficia do emprego de todas as modernas técnicas no sentido de impedir a progressivo isolamento; isolamento esse bem documentado no caso seguinte, de Wladimir, de 22 anos, incapaz de comunicação com qualquer outra pessoa, vitima da ignorância familiar, das atitudes de “tabu” e de “vergonha” geralmente sentidas em relação aos diminuídos. Finalmente, Heirich Fleischmann, o homem abando­nada pelas outras homens e inteiramente dedicada às plantas e aos animais.
Sobre a cegueira e a surdez poderia realizar-se um filme que fosse um “documentário”; ou uma “história”, mais ou menos “exemplar” que cedo cairia no melodrama; poderia olhar-se essa outra minoria humana com desinteresse ou especular com a emoção fácil da público. Poderia escolher-se a adesão primária, instantânea. Herzog optou pela simplicidade de um olhar atento que, sendo documental, ultrapassa a neutralidade impossível do “documento”.
De novo na filmografia de Herzog o estudo de um estado de incomunícação, isolamento, solidão. O pessimismo frente à con­dição humana? Eis a revelação da “Terra do Silêncio e da Escu­ridão”. Sendo, aparentemente, o filme que mais facilmente poderia cair num pessimismo radical, é, de entre todos os assinados por Herzog, aquele que maiores perspectivas abre para o exterior. Porque não se trata de um filme fechado sabre o circulo da incomunicabilidade, mas é, fundamentalmente, um filme dedicado àqueles que conseguem ultrapassar esses limites, na pessoa de Fini Straubinger, no seu exemplo, na sua vontade.
“Sempre me sobressalto quando me tocam” revela Fini. E mais adiante: “A sua mão afasta-se da minha e é como se esti­vessemos mil quilómetros distantes um do outro”. De olhos e ouvidos fechados para a mundo “se agora rebentasse a guerra, eu não o notaria”, cegos e surdos reinventam o poder de dar as mãos. Por isso Herzog chamou ao seu belo filme “uma monogra­fia sobre as mãos de uma cega-surda”, esse cordão que dela se estende para os outros, em fraternal solidariedade.
Continuando a explorar uma escrita de grande concisão (planos longos, movimentas raros e lentos, um ritmo de monta­gem necessariamente pousado, usufruindo de uma respiração suspensa sobre a olhar essencial), “Terra de Silêncio e da Escuri­dão”, é uma contribuição notável para o conhecimento dessas minorias marginalizadas por “tabus” absurdos. conhecimento que se impõe pelo respeito à pessoa humana, nunca como suporte de piedosas intenções. O mesmo espírito que se sentirá ter presidido à rodagem da obra.

AGUIRRE, O AVENTUREIRO

“Eu não fiz um filme latino-americano. Tenho uma grande simpatia pelos índios, mas não arvoro o estandarte da sua causa. Eles continuam a ser um mistério para mim e eu respeita a sua dignidade, deixando o seu mistério por resolver!” - Herzog.
Decorrendo em redor do ano de 1560, “Aguirre” poderá prin­cipiar por ser tomado apressadamente, como um filme sobre colonialismo, sobre os contactos entre duas civilizações, aqui a colonização espanhola que invade o selva em busca de conquista, de pode­ria, de riquezas, e os índios incas, resguardando a sua maneira de ser e de viver, os seus tesouros, a sua sobrevivência pessoal. Acontece que essa não era o intenção de Herzog. “Aguirre” não é um filme sobre o colonialismo, mas um filme sobre o poder, melhor dizendo o conquista do poder, onde o colonialismo nunca ultrapassa a situação de “pano de fundo”. Não é ainda um filme sobre o colonialismo porque, como o próprio Herzog se confessa em relação ao problema índio, fica distante do seu mistério: “Tenho uma grande simpatia pelos índios, mas não arvoro o estandarte da sua causa”. O que é evidente ao longo ao todo o filme. O centro nevrálgico deste é o acampamento flutuante das tropas espanholas e tudo o que se passa no seu seio. Os índios não ultrapassam a fronteira da “ameaça”. Funcionam unicamente como o “desconhecido” que vai condicionando uma marcha, acompanhando-a à distância, espiando o movimento dos prota­gonistas por detrás da insondável verdura que emoldura um rio. No dia 26 de Setembro de 1560, parte do litoral uma expedição que, comandado pelo nobre espanhol D. Pedro de Ursua, demandava o “Eldorado”. Para tanto, havia que subir rio acima, com o fito nos Andes e nos tesouros que a tradição dizia escon­derem-se para lá das montanhas. Assim se penetra pelo rio Marañon, se sobe depois o Ucayali, finalmente se chega ao Amazonas. Em jangadas que, uma agora, outra depois, se vão perdendo. De dificuldade, em dificuldade, de impossibilidade em impossibilidade.
A expedição parte, comandada por Ursua, mas, a certa altura do percurso, este, doente e antevendo dificuldades intrans­poníveis, ordena o regresso. A partir daqui sobressai uma perso­nagem até ai secundário, Lope de Aguirre, que subleva os com­panheiros e impõe à caravana o rumo da cobiça, da fama, da loucura. Aguirre passará a comandar de facto a expedição, ainda que para o conseguir tivesse que mimar um julgamento sumário do “traidor” Ursua e, para seu lugar, tenho feito eleger a manobrável e indolente D. Fernando de Guzman, imperador fantoche.
Perseguindo o sonho quimérico das honrarias e fortunas de que falara Pizarro, Aguirre desafia a História e inicia o seu rei­nado de terror. Fugindo um pouco à verdade factual histórica, Herzog descreve-nos um tirano que oscila entre o crueldade e a insânia, entre o legalismo forjado e a prepotência criminosa. Um a um, os seus companheiros de aventura (e de cativeiro) vão desa­parecendo, até que finalmente, perdido no meio de uma jangada habitada unicamente por centenas de macacos, Aguirre se encontra só, esbracejando contra o destino e o sorte.
Fundamentalmente, “Aguirre, o Aventureiro”, procura ser um estudo sobre o demagogia política que levo ao poder um louco.
Demagogia política ou maquiavelismo?
Filme sobre os insidiosos mecanismos do poder, com os seus paralelismos óbvios com alguns aspectos de uma realidade alemã muito distante, “Aguirre, o Aventureiro”, rompendo de alguma forma como o hermetismo que caracterizava as primeiros obras de Herzog, mantém-se, apesar disso, um prolongamento rigorosamente coerente da filmografia do cineasta.

O ENIGMA DE KASPER HAUSER

Prolongando o seu interesse por casos limites de anormalida­de, Herzog apaixona-se pela história de Kasper Houser, um jovem que, certa manhã do ano de 1828 (sabe-se a data precisa, o domingo de Pentecostes, dia 26 de Maio), “nasce”, imóvel e espantado, no centro da praça principal da cidade de Nurem­berg, agarrando na mão uma carta, dirigida ao “nobre Capitão de Cavalaria”. Kasper Hauser nada sabia até essa altura do mundo que o rodeava, sequer de si próprio. Enclausurado longos anos, vegetando unicamente como um animal, Kasper desconhe­cia a fala, a escrita, movendo-se com a dificuldade de quem per­maneceu desde sempre agrilhoado no funda de uma cave. No sua autobiografia (escrita temo depois), Kasper confessa que apenas lhe restava “a companhia de dois cavalos de madeira e um cão”, com quem “brincava sempre”.
Desta figura misterioso, desta vida enigmático que surge à luz do dia com dezassete anos completos, retiraram historiadores e ensaístas, escritores e artistas várias obras que nunca esgota­ram o tema, sequer para ele encontraram decifração lógica. As hipóteses que se colocam valem somente como hipóteses possí­veis, nada mais, já que nenhuma argumentação encontrou até agora as factos “irrefutáveis” para sobre eles se alicerçarem. Seria Kasper uma criança roubada, um filho de Napoleão, um louco, um indivíduo fugido de um circo equestre, um príncipe deserda­do, o fruto proibido de qualquer amor impossível? A dúvida sub­síste envolvendo o mistério.
Recolhido pelo município de Nuremberg, de novo aprisio­nado na torre do castelo, cedido depois para uma barraca de fei­ra, onde era exibido como “um dos quatro enigmas dos quatro cantos do mundo” (os outros três enigmas prendem-se com outras obsessões do cinema de Herzog: o rei anão, que vem directamente de “Os Anões Também Começaram por Baixo”; o índio “Hombrecito”, de “Aguirre”, e o jovem Mozart, antigo projecto ainda não concretizado), Kasper viria a ser recolhida pelo profes­sor Daumer que inicia a seu processo de educação, ensinando-a a falar, a ler, o escrever, a tocar piano, integrando-o enfim num mundo onde pré-existe uma cultura e uma civilização desconhecidas de Kasper. À medida que este vai exercitando a inteligên­cia, que vai descobrindo o mundo, por vezes nos seus mais ínfi­mos e imperceptíveis pormenores, algo se vai perdendo, a que, facilitando a palavra, se poderá chamar “inocência”. Perca que é tanto mais de sublinhar quanto em sua substituição se vai aden­sando um panorama onde sobressaem a hipocrisia, a rígida lógico escolástica, o pedantismo, a violência traiçoeira das punhaladas assassinas pelas costas. É desta altura a frase de Kasper que con­fessa ter sido a “sua aparição no mundo uma queda brutal”.
Deverá ter sido esta “queda brutal” de Kasper no vazio do mundo civilizado o que apaixonou Werner Herzog, um pouco na linha de um Truffaut, de “O Menino Selvagem”, ainda que entre ambos o filmes as diferenças sejam acentuadas. Enquanto o “Menino”, de Truffout, era uma criança que assumira a condição de “menino-lobo” (todo o seu contacta com a natureza lhe fornecera uma “educação” nesse sentido), em “Kasper”, de Herzog, o jovem de dezassete anos permanece incólume, puro em quase todos os contactos com o exterior. Era o seu um mundo vertiginosamente reduzido ao buraco negro de uma cave insalobra. Kasper asse­melho-se a um ser conservado e abruptamente arredada da mun­do. “Conservado”, poderá ser o termo, como se possível fosse conservar uma criança, adiando-lhe o nascimento. Como se aquela caverna negra prolongasse até ao limite do possível o ventre materna onde cresceu o feto.
Filme de um poeta, a quem a relação entre o indivíduo e o universo obceca. “O Enigma de Kasper Hauser” é necessariamente um filme sobre a linguagem, sobre o complexo contacto entre o homem e os outros, o homem e a natureza. O que leva Kasper a perguntar se “não ouvem em redor de si esses gritos assusta­dores a que comunmente se chama silêncio”, questão angus­tiante sobre que repousa grande parte do essência deste “Enigma” que, para lá das imagens mágicas de Herzog, conserva secreto e silencioso o percurso de um homem por sobre a terra. Discre­tamente povoado de fantasmas, de gritos assustadores que rom­pem o silêncio e ampliam para zonas de obscuro conhecimento a razão última desta ode desesperada que
a solidão encerra.

CORAÇÃO DE GELO

“Coração de Gelo”, de 1976, é uma das experiências mais invulgares de toda a história da cinema, dado que neste filme Werner Herzog dirigiu quase todo o elenco depois de ele próprio o ter hipnotizado. Este facto não é um mero recurso de propa­ganda para “vender” o título (foi dos filmes deste cineasta mais mal recebidos pelo público, mantendo-se pouco tempo no cartaz nas cidades ande foi estreada - veja-se o caso de Lisboa, reti­rado da sala onde estreou, depois de uma curta semana de exi­bição), mas como método escolhida para provocar uma ambiên­cia mágica, chamemos-lhe assim, que a obra logra quase intei­ramente. O estilo de representação tem como consequência um clima muito próprio, vagueando os actores pelos cenários em estado de quase letargia, recitando um diálogo arrastado e sila­bado, movendo-se com a lentidão de zombies, como que filma­dos em “slot motion”. É evidente que Herzog pretendia isso mes­mo, para desta forma criar uma atmosfera diferente, no que tam­bém é auxiliado pela beleza das paisagens onde decorre grande parte desta película que se poderá considerar “iniciática”.
No sul da Alemanha, precisamente nas florestas da Baixa Baviera, num tempo indefinido, que tanto pode ser o século XVIII, como o XIX, o jovem dono de uma fábrica de vidro tenta, por todas os meios, encontrar o segredo perdido da fabricação do “vidro-rubi”, cujo inventor, recentemente falecido, levou consigo para o túmulo. Esta pesquisa, e a sua ineficácia, levam o prota­gonista a uma forma progressiva de loucura que o conduzem ao sacrifício de uma jovem virgem, pensando que o sangue desta, derramado e ofertado à fórmula secreta, conseguiria penetrar no segredo alquímico. Acabará, no entanto, por deitar fogo à fábri­ca.
Na mesma floresta, um pastor vidente, Hias, mantém um longo diálogo consigo próprio e com a natureza, através de um texto de significado cifrado, mas cuja beleza literária será um dos motivos de criação do “maravilhoso” no filme. Hias profetiza a morte de um camponês e o incêndio da fábrica, da mesma forma que fala de uma “nova era que se anuncia “de infelicidade e de loucura”. O pastor será julgado pelos populares como culpado pelas visões que, finalmente, se concretizam, sendo mais tarde libertado para continuar a vaguear pelas montanhas, onde as previsões catastróficas se multiplicam, prevendo tempos de destruição e violência, com “as fábricas condenadas a desaparece em chamas e os castelos a sucumbir em ruínas”.
Há como que um tempo lendário, mítico, desdobrando-se e inundando toda a obra de uma grande beleza “maldita”. Herzog surge obviamente associado à figura deste profeta do fim do mundo, pelo menos deste mundo tal como o conhecemos. É pelas palavras de Hias que sabemos da ameaça do “caos”, onde “ninguém amará ninguém”, onde “não se poderá comprar um pedaço de pão”, onde os homens se matam por qualquer pequeno incidente, onde as “pessoas da cidade partem para os campos pedindo aos camponeses para estes as deixarem traba­lhar nas suas terras e serão aí chacinadas”.
Obra de um visionário amargurado pelo destino do mundo, pelo atmosfera de guerra dia-a-dia crescente, pela desumaniza­ção dos sentimentos, pelo impotência em atingir o “Idade da Ouro” (o segredo do “vidro-rubi” pode equivaler-se aqui a algo de semelhante ao segredo alquímico da obtenção do ouro), “Coração de Gelo” é, todavia, um filme que, por força do seu hermetismo por vezes desnecessário, se torno demasiado complexo e pouco acessível, fascinando aqueles que facilmente se deixam levar nesta “viagem” iniciática, mas afastando definitivamente quem com ela não se identifique desde inicio. No conjunto da obra de Werner Herzog, este será possivelmente o “filme culto” que alguns amam desmedidamente, mas que muitos mais repu­diam, acusando-o de uma mera experiência formal fracassada.

A CANÇÃO DE BRUNO S.

Mantendo fortes pontos de contacto com “O Enigma de Kas­por Hauser” (mantendo inclusive o mesmo actor, Bruno S.), “Stros­zek” é um filme desarmantemente claro na sua escrita, que, toda­via, releva de um estilo, de um tom muito pessoal, quase impos­sível de classificar. Dir-se-ia um hiper-realismo poético, tendendo à parábola. Os cenários são minuciosos, os movimentas claras e reduzidos ao essencial, os enquadramentos sóbrios e demora­dos. A acção progride linearmente. O tom de pequena crónica do quotidiano instala-se Ientamente. Crónica de uma vida margi­nalizada no interior das sociedades ditas de abundância. Bruno Stroszek, músico ambulante, personagem com o seu quê de “anormal” (pelo menos na forma cândida como enfrenta o mundo e nele se expõe), sai mais uma vez da cadeia, depois de uma das amiudadas prisões por que passa em virtude do seu exagerado gosto pela cerveja. À saída encontra Eva, uma jovem prostituta que aloja em sua casa, depois de a ver maltratada par dois chulos. Um velha vizinha acena-lhes então com o sonho, a utopia, a América, a terra das oportunidades. Para lá partem e nela se perdem.
Bruno S., que conhecia as grades das prisões de Berlim e a violência desbragada dos truões alemães, irá descobrir na Amé­rica, nesse novo mundo prometido, uma violência contida, refrea­da, climatizada, íntima, a que não consegue sobreviver.
A mecanização domina o jogo e impõe um andamento pró­prio, que irá triturar quem não o aceita (ou não pode aceitar). Como a galinha que toca piano, ou aquela outra que dança ao som do disco, como o coelho bombeiro (mais uma vez os animais ocupam um destacado lugar no cinema de Herzog), Bruno S. terá que se encaixar na engrenagem e nela se moldar, sob pena de sucumbir. São as prestações para a casa prefabricada, para a televisão a cores e o frigorífico, é Eva que o abandona, tro­cando-a por um camionista, é a vida que lhe passa ao lado e que, na inocência do seu olhar, na limpidez das suas mãos, ele não consegue agarrar, Transformado num “fora-da-lei” sem ter percebido muito bem porquê, Bruno S. abandona à deriva um camião roubado, enquanto parte ele próprio sem destino, no banco suicida de um telesférico que o conduzirá quem sabe ao cimo de que monte. Uma ingenuidade que, contudo, lhe permite ainda perceber a trama envolvente que o agarra, esse sorriso hipócrita de um agente bancário que lhe aponta as grandes van­tagens da sua organização e os perigos de não pagar o que deve, bem assim como todo o ambiente de solicitações várias que obrigam ao consumo impensado e irracional, e transformam o homem em presa de si próprio.
“Uma violência mais discreta, mais intima”, acusa Bruno S. Admiravelmente dirigido pelo sensibilidade delicada e estranha de Herzog, esta “Canção” vive ainda da interpretação de Bruno S., que é já hoje uma figura carismática na cinematografia germâ­nica.
O mistério envolve este actor (?), esta personalidade que se diria saída de um asilo de atrasados mentais, e cuja limpidez da olhar permite todas as suposições e aventuras. Um filme admirá­vel.

NOSFERATU, O FANTASMA DA NOITE

“Nosferatu, o Fantasma do Noite”, tem uma história atrás de si que será interessante revelar. Trata-se da adaptação do célebre romance de Bram Stocker, “Drácula”, mas através de uma outra versão cinematográfica alemã, ainda muda, rodada em 1921, por um dos maiores cineastas de todos os tempos: Friedrich Wilhelm Murnau. Foi a esse “Nosferatu, o Vampiro” que Werner Herzag foi beber a inspiração, o clima, inclusive o recorte físico dos personagens. Não se trata, todavia, de uma “remake” mais ou menos fiel de um clássico, aquilo que Herzog conseguiu com o seu “Fan­tasma da Noite2. Se existem no filme de Herzog nomeadamente muitas planos que referenciam de imediato outros de Murnau, a evidência desse facto não pode ser interpretada de outra forma senão como de uma citação que se inscreve em jeito de home­nagem àquele que Herzog considera “o maior realizador alemão de sempre”.
A história é quase textualmente a mesma, deslocando-a Her­zog, uma vez por outra, para novos campos. Mas no essencial segue a par e passo o itinerário de Jonathan Harker que se dirige à Transilvânia para aí encontrar o Conde Drácula que se quer transferir para a cidade onde Harker vive e onde este se lhe pro­põe alugar um velho castelo em ruínas. Na viagem de regresso, Jonathan trará consigo a doença, enquanto o conde Drácula, ou Nosferatu, o morto-vivo, por entre caixões com terra e milhares de ratos, transportará a peste. Peste que se instala na cidade, lhe percorre as ruas como o sangue viajando pelas veias. Uma cidade sitiada que sucumbe Ientamente, que a Morte povoa de horror, mas que também liberta para os prazeres e a alegria última dos condenados. Nesta cidade em derrocada, Nosferatu é senhor e servo. Detentor do poder que a morte confere, ele é igualmente sua vítima. O medo da eternidade que se lhe revela (“há coisas bem piores que a morte”, confessa), o solidão dos seus dias de furtivo, o desamor das suas horas transparecem na máscara amargurada de Klaus Kinski, o actor que encarna o figura de Drácula. lsabelle Adjani, na sua pureza frágil e delica­da, será Lucy, a mulher que pressente o perigo para lá das apa­rências e se oferece para o deter num duplo sacrifício de amor. Mas a ameaça prosseguirá, sob um novo rosto. A peste irá alas­trar. Os ratos, comandadas pelos profetas da Morte, são legiões que partem à conquista de novas cidades.
Se o filme de Murnau prenunciou, por dentro, o advento do nazismo, que no inicia dos anos 20 pairava já como ameaça a que os poetas eram sensíveis, a obra de Werner Herzog pode bem ser a equivalente relativo aos anos 70. Que futuro será o nosso, quando os poetas do fantástica nos falam de “O Ovo da Serpente” ou de “Nosferatu” e cineastas de um e outro realismo nos apontam o “Apocalipse” para já?

WOYZECK, O SOLDADO ATRAIÇOADO

Retirado de uma peça teatral de Georg Buchner, “Woyzeck, o Soldado Atraiçoado”a é um dos raros argumentos não originais de Herzog, ainda que o tratamento dado ao texto e a aparente iden­tidade de pontos de vista entre a cineasta e o poeta-dramaturgo faça com que o filme resulte uma obra profundamente coerente e enquadrada no espírito e nas preocupações de Herzog, sem trair de qualquer forma as intenções de Buchner, desaparecido em 1837, apenas com 23 anos de idade, deixando em esboço esta peça que tem apaixonado gerações, com um pequeno inter­valo de quinze anos, durante o qual foi interdita pelas autorida­des nazis
“Woyzeck” surge assim a quem dela se aproxima como uma obra inacabada, à espera de alguém que ordene os seus ele­mentos e unifique dramaticamente o todo. Isso mesmo consegue o cineasta alemão, por vezes de forma brilhante, contando para isso com a colaboração do seu actor preferido, Klaus Kinski, e de Eva Mattés, Grande Prémio de interpretação feminina no festival de Cannes.
Numa pequena cidade checa, em meados do século XIX, o soldado Franz Woyzeck trabalha em diversas ofícios procurando manter Mano, a mulher com quem vive, e o filho natural. O capi­tão do seu regimento oprime-o, o médico faz nele experiências humilhantes, a mulher traí-o com um militar músico que garbosa­mente passa diante da sua janela integrado na fanfarra. Woyzeck sofre em silêncio, até que um dia explode a sua ira e apunhala Maria, procurando lavar-se do sangue que o mancha, pene­trando cada vez mais longe, cada vez mais profundamente nas águas, onde desaparecerá.
Em “Woyzeck”, Herzog volta a abordar um tema que já explo­rara em “Sinais de Vida” e que voltará a ocupá-lo ao longa de toda a sua filmografia, como uma constante: a solidão, a humi­lhação diária, o acumular de sintomas de uma loucura que pro­gride à medida que a sociedade fecha o cerco em redor de um protagonista fraco. Um ser que lentamente se marginaliza até à explosão final que quase sempre reune a violência e a auto-des­truição.

FITZCARRALDO

Werner Herzog continua um cineasta invulgar. A sua filmografia atesta-o bem. E um homem que caminha quase sempre na linha de demarcação entre o normal e o anormal, o real e o fantástica, o sistema e a marginalidade. O seu cinema é o de um visionária, a sua aposta quase sempre excessiva e desmedida, qualquer que seja o aspecto por que é analisada. O seu interesse pela perso­nalidade lendária do aventureiro Brian Sweeney Fitzgerald, mais conhecida por Fitzcarraldo, alcunha que lhe foi posta pelos índios amazónicos, é uma curiosidade perfeitamente coerente com todo as obsessões e preocupações anteriormente expressas na sua já longo filmografia. Dir-se-ia, a princípio, como que um prolonga­mento de “Aguirre, o Aventureiro”, filme que abriu o caminho do êxito internacional deste cineasta onde a principal figura era igualmente interpretada por Klaus Kinski, alter-ego de Herzog, que regressou aqui no papel de Fitzcarraldo. Desta feita assumindo-se ainda mais como retrato e voz do autor, estabelecendo a liga­ção entre Fitzcarraldo e Herzog, unindo em si dois sonhos desme­didos que se amalgamam. Na verdade, “Fitzcarraldo” - o filme - é bem um projecto à altura do megalómano projecto de Fitzcar­raldo ao pretender atravessar uma colina com um navio.
Aliás, o aspecto mais interessante e fascinante deste filme é precisamente esta sobre­posição de sonhos que se concretizam contra tudo e contra todos. Por um lado, a vontade de Fitzcarraldo, apaixonado pela ópera, que procura construir um teatro em plena selva para aí trazer o divino Caruso. Essa obsessão leva-lo-á a tentar enrique­cer com base no negócio da borracha, demarcando em seu pro­veito uma zona inóspita, onde dificilmente o homem penetra. O lado visionário de Fitzcarraldo obrigo-a o ultrapassar todos os obstáculos, e quando uma língua de terra divide dois afluentes de um rio, Fitzcarraldo obriga o seu navio a subir a montanha, des­cer pela vertente do lado contrário e penetrar nas águas nova­mente.
Mas não é só contra a descrença trocista dos velhos colonos, nem só contra a adversidade da Natureza, que Fitzcarraldo se bate. E também contra os índios que o espreitam das duas margens e, finalmente, enchem o rio com as suas ameaça­doras embarcações. Será ao som de Caruso que Fitzcarraldo transporá esse obstáculo, sendo então visto como o enviado dos deuses, aquele que vem aplacar as suas iras. O que a salva num primeiro momento, mas que irá fazer perigar a sua aventura, quando os mesmos índios resolvem libertar o navio ao sabor dos rápidos, inviabílízando a parte comercial do empreendimento.
Fitzcarraldo não constrói a ópera em plena Amazónia, mas manterá, ainda assim, a promessa feita, contratando uma orquestra e cantores para subir o Amazonas a borda do seu “Molly-Aída” e espantar a população de Manaus com as árias de “Os Puritanos”, de Bellini.
Este sonho de Fitzcarralda é adaptado por Herzog, que o faz seu: ele próprio irá descer igualmente o Amazonas, embre­nhando-se na selva que continua inóspita, desafiando a descon­fiança dos índios, levando consigo um conjunto de técnicos e actores, alguns dos quais irão abandoná-lo a meio do percurso (Jason Robards, com disenteria; Mike Jagger, farto do ambien­te...). Revoltas de índios, acidentes diversos, várias bobinas des­truídas, inundações e tempestades, por tudo irá igualmente pas­sar; o seu sonho é pôr em imagens um outro sonho demencial. Obstinadamente, continua a aventuro, para lá de tudo o que possa parecer humanamente suportável. O resultado é uma obra que se não pode desligar desta atribulada génese: é óbvio que, no seu conjunto, o filme de Herzog reflecte as vicissitudes do tra­jecto, apresentando-se algo desequilibrado, com sequências bri­lhantes ao lado de outras que o são menos. Mas desprende-se da obra uma tal força telúrica, um lirismo tão repassado de amar­gura, um espírito de aventura de tal forma desesperado, que o transformam num momento de obstinada teimosia e loucura, a que não podemos ficar indiferentes. Klaus Kínsky, por seu turno, consegue transportar no rosto os estigmas dessa loucura que transita de Fitzcarraldo para Herzog e em si cristaliza.

A TERRA ONDE AS FORMIGAS VERDES SONHAM E COBRA VERDE

Os dois filmes seguintes de Werner Herzog são “Where The Green Ants Dreams”, rodado no Austrália, e “Cobra Verde”, que tem por cenário o Brasil e o Ghana, em África.
No primeiro, uma grande companhia mineira procura explo­rar o urânio no deserto, na centro do Austrália, mas encontra a oposição de Miliritbi e do tribo dos Riratjingu, aborígenes que consideram essa terra sagrada, o “terra ande sonham as formi­gas verdes”. O confronto será não violento: de um lado os “bulldozers”, do outro a obstinácia dos indígenas, depois as pro­messas, logo as ameaças... Um dos geólogos começa mesmo a entender as razões dos Riratjingus, o caso vai para tribunal, mas aí “a força do progresso” e sobretudo dos interesses em jogo pende para a lado da companhia. A tribo será evacuado de avião, onde os Riratjingus mantém as suas tradições, acendendo archotes e fogueiras. O geólogo afasta-se do deserto, nessa altura percorrido por um tornado que tudo parece consumir.
“Cobra Verde” é o pseudónimo de Francisco Manuel da Silva que, no séc. XIX, deixa o deserto brasileiro para se tornar pesqui­sador de ouro. Rapidamente se transforma num fora da lei, depois de alguns crimes cometidos, fugindo então para a Bahia, onde é contratado como capataz de um latifundiário e traficante de escravos. Humilhado por estas funções, Cobra Verde engra­vida as três filhas do patrão que se vinga enviando-o como exilado para África com o pretexto deste reunir escravas no Ghana e trazê-las para o Brasil. O rei deste país é um sanguinário tirano e Cobra Verde coloca-se a seu lado, arvorando-se Vice-Rei, organizando tranquilamente o tráfico de escravos. Mas um golpe de estado irá alterar a ordem estabelecida.
Neste trabalho, Werner Herzog volta a trabalhar com Klaus Kinski, mas as desinteligências entre actor e realizador cavaram um fosso dificilmente transponível no futuro, pela que esta foi também a derradeira cola­boração Herzog-Kinskí. Kinski, até inícios da década de 70 um medíocre, mas marcante actor de “westerns” italianos, tornou-se célebre na pri­meira obra rodada por Herzog, “Aguirre, o Aventureiro”. Depois foi sucessivamente protagonista de “Nosferatu, o Vampiro da Noite”, “Woyzeck, o Soldado Atraiçoado” e “Fitzcarraldo”. Sem a sua parti­cipação nestes títulos, que lhe grangearam fama coma intérprete, a coroa de glória de Klaus Kinski seria ter sido o pai de Nastassja Kinskí.
Klaus Kinski nasceu a 18 de Outubro de 1926, em Zoppot, Danzig, Alemanha (agora Sopot, Gdansk, na Polónia), e viria a falecer a 23 de Novembro de 1991, em Lagunitas, California, (EUA), vítima de um ataque cardíaco. Em 1999, Herzog retoma Klaus Kinski para um documentário intitulado “Mein liebster Feind - Klaus Kinski”, onde recorda a colaboração mantida entre ambos e as cinco obras que os ligaram: “Aguirre, o Aventureiro”, “Nosferatu, o Vampiro da Noite”, “Woyzeck, o Soldado Atraiçoado”, “Fitzcarraldo” e “Cobra Verde”.
Lauro António


(texto escrito em 1989, e revisto em Março de 2003)

WERNER HERZOG
Filmografia:


1962-1965
HERAKLES
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (preto e branco, 35 mm): Jaime Pacheco; Música: Uwe Brandner; Montagem: Werner Herzog; Produção: Werner Herzog / Cineropa FiIm / Walter Kruttner; Intérpretes: Mr. Germany;
D: 12 m. Rodado em Munique.

1964
SPIEL IM SAND
(Jogo na Areia)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (preto e branco, 35 mm): Jaime Pacheco; Música: Uwe Brandner; Produção: Werner Herzog; Intérpretes: crianças de uma colónia croata no sul da Austria;
Duração: 14 m. Rodado no sul da Austria, Transdarf on der Wulka.

1967
DIE BIESPIELLOSE VERTEIDIGUNG DER FESTUNG DEUTSCHKREUTZ
(A Exemplar Defesa da Fortaleza de Deutschreutz)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia: (preto e branco, 35 mm): Jaime Pacheco; Montagem: Werner Herzog; Produção: Werner Herzog Film produktion / Arpa Film / Bruno Zockler;
Intérpretes: Peter H. Bumm, Georg Eska, Karl-Heinz Steffel, Wolfgang Von Ungern-Sternberg;
Duração: 14 m. Rodado na fronteira austro-húngara.

1967
LEBENSZEICHEN
(Sinais de Vida)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog, segundo “Der Tolle Inva­lide Auf Dem Fort Ratonneau”, de Achim Von Amim; Fotografia (preto e branco, 35 mm): Thomas Mauch e Dietrich Lohmann; Montagem: Beate Mainka e Maximiliam Mainka; Música: Stavros Xarchakos; Produção: Werner Herzog Filmprodukion;
Intérpretes: Peter Brogle (Stroszek), Wolfang Reich­mann (Meinhard), Athina Zacharopoulou (nora), Wolfgang V.U. Sternberg (Decker), Wolfgang Stumpf (capitão), Júlio Pinheiro (ci­gano), Florian Fricke (pianista), etc.;
Duração: 90 m. Rodado na Ilha de Cos e em Creta.

1967
LETZTE WORTE (Últimas Palavras)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (preto e branco, 35 mm): Thomas Mauch e Dietrich Lohmann; Montagem: Beata Mainka: Música: Música popular de Creta; Produção: Werner Herzog Filmproduktion;
Duração: 15 m. Rodado em Creta e Spinalonga.

1968
MASSNAHMEN GEGEN FANATIKER
(Medidas contra os Fanáticos)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 35 mm): Dietrich Lohmann e Jorg Schmidt-Reitwein; Montagem: Beate Mainka-Jelling­haus; Produção: Werner Herzog Filmproduktion;
Duração: 11 m.

1968-1970
FATA MORGANA
(Fata Morgana)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 35 mm): Jorg Schmidt-Reitwein; Montagem: Beate Mainka-Jellinghaus; Música: Mozart, Handel, Blind Faith, François Couperin, Leonard Conen; Produção: Werner Herzog Filmproduktion;
Intérpretes: Wolfgang Von Ungern-Sternberg, James Wil­liam Gledhill, Eugen des Montagues; Colaboração de Lotte Eisner, Gunther Welpert, Wolfgang Bachler, Manfred Eigendorl, Hans Dieter-Saver, Gunther Feyse, Wolfçcng Eisendorf, etc.;
Duração: 79 m. Rodado no Quénia, Tanzânia, Sahara, Nigéria, Alto Volta, Mali, Costa do Marfim, Lanzarote (llhas Canárias).

1969
DIE FLIEGENDEN ÄRZTE VON OSTAFRIKA
(Os Médicos Voadores do Leste de África)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 35 mm): Jorg Schmidt-Reitwein; Montagem: Beate Mainka-Jellinghaus;
Duração: 45 m. Rodado em África, para TV.

1969-1970
AUCH ZVVERGE HABEN KLEIN ANGEFANGEN
(Também os Anões Começam por Baixo)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (preto e branco, 35 mm): Thomas Mauch e Jorg Schmidt-Reitwein; Montagem: Beata Mainka-Jel­linghauss; Música: Florian Fricke; Arranjos de música popular espa­nhola de Werner Herzog; Som: Herbert Prasch; Produção: Francisco Ariza / Werner Herzog Filmproduktion;
Intérpretes: Helmut Doring, Gerd Gic­kel, Paul Glauer, Ema Gachwendtner, Gisela Hertwig, Gertthar Marz, NarreI Minkner, Alfredo Piccini, Gertraud Piccini, Brigitte Sear, Marianne Seor, Ema Smolarz, Lalas Zsarmoczav, etc.; Duração: 96 m. Rodado em Lanzarote (llhas Canárias).

1970
BEHINDERTE ZUKUNFT
(Futuro Comprometido)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog, segundo ideia de Hans Reter Meier; Fotografia (cor, 16 mm): Jorg Schmidt-Reitwein; Montagem: Beata Mainka-Jellinghaus; Som: Werner Herzog; Produção: Werner Herzog Eilmproduktion; Narração: Rolf llling;
Duração: 63 m. Rodado em Muni­que, Hannover e Los Angeles.

1971
[AND DES SCHWEIGNS UND DER DUNKELHEIT
(A Terra do Silêncio e da Escuridão)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia: (cor, 16 mm): Jorg Schmidt-Reitwen; Montagem: Beata Mainka-Jellinghauss; Som: Werner Herzog; Música: J.S. Bach, Vivaldi; Produção: Werner Herzog Filmproduktion; Narração: Rol llling;
Intérpretes: Fini Staubinger, Heinrich Fleischmann, VIa­dimir Kokol, M. Baaske, Resi Mittermeier;
Duração: 85 m. Rodado em Munique e arredores.

1972
AGUIRRE, DER ZORN GOTTES
(Aguirre, o Aventureiro)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia: (cor, 35 mm): Thomas Mauch e João Orlando Macchiavello; Música: Popol Vuh; Montagem: Beata Mainka-Jellinghauss; Som: Herbert Prasch; Produção: Walter Soxer / Werner Herzog Filmproduktion/ Hessischer Rundfunk;
Intérpretes: Klaus Kinski (D. Pope de Aguirre), Helena Rolo (lnez de Atienza), DeI Negro (Frei Gaspar de Carvajal), Ruy Guerra (D. Pedro de Urzua), Peter Berling (D. Fernando de Guzman), Cecilia Rivera (Flores de Aguirre), Dany Ades (perucho), Armando Polanah, os índios da cooperativa Lauramarca, etc.;
Duração: 93 m. Rodado no vale de Urubamba, rio Huallaga, rio Nanoy, Perú; Dist. em Portugal: Talma Filmes; Estreia: Satélite, 4-3-1974.

1974
DIE GROSSE EKSTASE DES BILSCHNITZERS STEINER
(O Grande Êxtase do Escultor de Madeira Steiner)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 16 mm): Jorg Schmidt-Reitwein, Francisco João, Frederik Hettich, Alfred Chrasziel, Gideon Meron; Música: Popol Vuli; Montagem: Beata Mainka-Jellinghauss; Produção: Werner Herzog Filmproduktion / Suddentscher Rundfunk;
Intérpretes: Walter Steiner;
Duração: 45 m. Rodado em Planica (Jugoslávia) e Wild­hauss (Suiça).

1974
JEDER FUR SICH UND GOTF GEGEN A[LE
(O Enigma de Kasper Hauser)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 35 mm): Jorg Schmidt-Reitwein e Michael Gast; Música: Pachelbel, Orlando di Las­so, Albinoni e Mozart; Cenários: Henning Von Gierde; Montagem: Beata Mainka-Jellinghauss; Som: Haymo Henry Heyder; Produção: Werner Her­zog Filmproduktion / ZDE;
Intérpretes: Bruno S. (Kasper), Walter Ladengast (Daumer), Brigitte Mira (Kathe), Hans Musaus (o desconhecido), Willy SemmeIrodge (director do circo), Michael Kroecher (Lord Stanhope), Henry Von Lyck (capitão), Enno Patalas (Padre Fuhr­mana), Elis Pilgrin (segundo padre), Volker Pretchtel (Hiltel), Gloria Doer (Franc HiItel), Helmut Doring (o pequeno Rui), Kidlat Tahinik (Hombrecito), Andi Gottwald (o jovem Mozart), Dr. Willy Meyer-­Furst (médico), etc.;
Duração: 109 m. Rodado em Dinkelsbuhl e arredo­res, na Irlanda e no Sahara espanhol; Dist. em Portugal: S.I.F.; Estreia: Estúdio Apolo 70, 28-10-1977.

1975
HOW MUCH WOOD WOULD A WOODDCHUCK CHUCK
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 16 mm): Thomas Mauch, Francisca Joan e Ed Lachmann; Música: Shorty Eager e The Eagle Beavers; Montagem: Beata Mainka-Jellinghaus; Som: Werner Herzog e Walter Saxer; Produção: Walter Saxer / Werner Herzog Filmproduktion;
Intérpretes: Ralf Wade, Alba BalI, Steve Liptay, Aba Diffenbach;
Duração: 44 m. Rodado em Fort Colhas, Colorado, e em New Holland, Pennsylvania.

1976
MIT MIR WILL KEINER SPIELEN
(Ninguém quer Brincar Comigo)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 16 mm): Jorg Schmidt-Reitwein; Som: Haymo Henri Heyder; Montagem: Christian Weisenborn; Produção: Werner Herzog Filmproduktian / lnstituto de Explo­ração Científica e Pedagógica da Cinema e da Imagem (FWU);
Duração: 14 m. Rodado em Munique, Furstenried.

1976
HERZ AUS GLAS
(Coração de Gelo)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Herbert Achternbusch e Werner Herzog; Fotografia (cor, cinemascope, 35 mm): Jorg Schmidt-Reitwein; Montagem: Beata Mainka-Jellinghaus; Música: Popol Vuh e Studio der Fruhen Musik; Cen: Henning Voa Gierke, Cornelius Siegel; Som: Haymo Henry Heyder e Reter Voa Anft; Assistentes: Dr. Claude Chiarini, na Fritsche, Aba Greenberg e Patrick Leroy; Produção: Werner Herzog EiIm­produktion; Intérpretes: Josef Bierbichler (Hias, Berger e Vidente), Stefan Guttler (proprietário da fábrica de vidro), Clemens Scheitz (Adal­bert), Volker Prechtl (Wudy), Sonja Skiba (Ludmilla), Brunhilde Klockner (Paulin, a louca), Wolf Albrecht (Sam), Thomas Binkley (o tocador de mandolin), Janos Fischer (Agide), Wilhelm Friedrich, Edite Gratz, Alais Hruschka, Egmont Hugel, Sterling Jones, Wol­fram Kunkel, etc.;
Duração: 94 m. Rodada em Wyoming, Alaska, Utah (EUA), Franenau, perto de Zwiesel (floresta bávara), Kohlschach­ten, Schloss Walchsing (Baixa Baviera) e Pischelsdorf (Baixa Baviera), Via Mala (Grissons), Skelling Park (oeste da Irlanda); Dist. em Portugal: S.l.F.; Estreia: Cinebolso, 18-7-1980.

1976
LA SOUFRIÉRE
(A Sofredora)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 16 mm): Jorg Schmidt-Reitwein e Ed Lachmann; Montagem: Beata Mainka-Jelling­haus; Som: Werner Herzog; Produção: Werner Herzog Filmproduktion;
Duração: 31 m. Rodado em Guadalupe.

1977
STROSZEK
(A Canção de Bruno S.)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 35 mm): Thomas Mauch, Ed Lachmann; Música: Chet Atkins, Sonny Terry; Som: Haymo Henry Heyder, Reter Voa Anft; Assistentes: Waifgang Knigge e Stefano Guidi, Cornelius Siegel, Hening Voa Gierke, Reter Hoiz;
Intérpretes: Bruno S. (Stroszek), Eva Mattes (Eva), Clemens Scheitz (Scheitz), Wilhelm Voa Homburg (apoiante), Clayton Szlapinski (garagista), Ely Rodriguez (garagista índio), Alfred Ede (director de prisão), Scott McKain (empregado de banco), Dr. Vlacbav Vojta (médico), Michael Gahr (preso), Yucsel Topcugurler (preso), Bob Evans (cliente do restaurante);
Duração: 108 m. Rodado em Plainfield, Wiscon­sin, Cherokee, Carolina do Norte, Nova Iorque, Berlim, Munique; Dist. em Portugal: Filmes Lusomundo; Estreia: Apolo 70, 11-9-1978; Quarteto, 22-6-1979. Filme de Qualidade.

1978
NOSFERATU - PHAMTOM DER NACHT
(Nosferatu, o Fantasma da Noite)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog, segundo o filme de Frie­drich Wilhelm Murnau e romance de Bram Stocker (“Dracula”); Fotografia (cor, cinemascope, 35 mm): Jorg Schmidt-Reitwein e Michael Gast; Música: Papal Vuh, Richard Wagner, Charles Gounod, Vok Ansambl Gordela; Montagem: Beata Mainka Jellinghaus; Som: Harald Maury; Cenários: Henning Voa Gierke; Caracterização: Reiko Krukt, Dominique Colladaat; Luz: Martin Gerbl: Efeitos Especiais: Cornelius Sie­gel; Assistentes: Mirko Tichacek, Remmelt Remmelts; Produção: Walter Soxer / Werner Herzog Filmproduktion / Gaumont;
Intérpretes: Kbaus Kinski (Conde Drácula), lsabelíe Adjani (Pucy), Bruno Ganz (Jonathan), Jacques DufIho (capitão), Roland Topar (Renfield), Walter Laden­gast (Dr. Von Helsing), Don Von Husen (guarda), Jan Groth (comandante do porto), Carsten Bodinus (Schroder), Mortje Grah­mann (Mina), Ryk de Grooyer (funcionário), Clements Scheitz, Lo Voa Hensbergen, John Leddy, Margiet Von Hartingsveld, Tim Beekman, BeverIy Walker, Rudolf Wolf, Johoan te Slaa, Claude Chiarini, Stefan Husar, etc.;
Duração: 107 m. Rodado em Pernstein, nos montes Tatros, em Nedvedice, Tela (Checoslováquia), Guana­juato (México), Delft, Schiedam, Oostvorne (Mar do Norte), Lubeck, Eartnoch-Klomm; Dist. em Portugal: Filmes Castello Lopes; Estreia: Condes e Estúdio, 19-6-1979. Filme de Qualidade.

1978
WOYZECK
(Woyzeck, o Soldado Atraiçoado)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog, segundo peça teatral de Georg Buchner; Fotografia (cor, 35 mm): Jorg Schmidt-Reitweia; Som: Harald Maury, Jean Fontaine; Música: Fiedelquartet Teia, Vivaldi, Benedetto Marcello; Cenários: Henning Voa Gierke; Luz: Martin Gerbl; Montagem: Beata Mainka-Jellinghaus; Assistente: Mirko Ticha­cek; Produção: Walter Saxer / Werner Herzog Filmproduktion;
Intérpretes: Kbaus Kinski (Woyzeck), Eva Mattes (Maria), Wolfgang Reichmann (ca­pitão), Willy Semmelrodge (médico), Josef Bierbichler (tamborei­ro), Paul Burian (Andres), Volker Prechtl (artesão), Dieter Augustin, lrm Hrmann, Wolfgang Bachler, Rasy-Rosy Heinikel, Herbert Fux, Thomas Mettke, Maria Mettke, etc.;
Duração: 81 m. Rodado em Talc (Checoslováquia); Dist. em Portugal: Filmes Castello Lopes; Estreia: Quarteto, 21 -6-1980. Filme de Qualidade.

1982
FITZCARRALDO
(Fitzcarraldo)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 35 mm): Thomas Mauch; Música: Papal Vuh; Montagem: Beata Mainka-Jellinghaus; Cenários: Henning Voa Gierke e Ulrich Bergfelder; Efeitos Especiais: Miguel Vasquez; Luz: Raimund Wirner e Hans-Peter Vogt; Assistentes: Jorge Vignati e Frederico Contabonieri; Produção: Werner Herzog Filmproduktion / Project Filmproduktion da Filmverbag der Antoren / Wildlife Films (Rerm) / Gaumont;
Intérpretes: Klaus Kinski (Brian Sweny Fitzgerald, chamado Fitzcar­raldo), Claudia Cardinale (MolIy), José Lewgoy (Don Aquilino), Miguel Angel Fuentes (Cholo), Paul Hittscher (capitão Orinoso - Paul), Huerequeque Enrique Bahor (cozinheiro), Grande Othelo (chefe de gare), Peter Berling (director de ópera), David Perez Espinosa, Milton Nascimento, Rui Pobanah, Salvador Godinex, Dieter Milz, Bill Rose, Leoncio Bueno, índios de Ashininka, Campa da Grande Pajonal e índios de Campo do Rio Tambo;
Duração: 180 m. Rodado no Perú e Brasil. Dist. em Portugal: Filmes Castello Lopes; Estreia: Londres e Charlot, 6-1-1983. Filme de Qualidade.

1984
WHERE THE GREEN ANTS DREAM
(A Terra onde as Formigas Verdes Sonham)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog; Fotografia (cor, 35 mm): Jorg Scnmidt-Reitwein; Montagem: Beata Mainka-Jeilinghaus; Música: Gabriel Fauré, Ernest Bloch, Klaus-Jochen Wiese, Richard Wagner, Wand­juk Marika; Efeitos Especiais: Brian Pearce; Som: Claus Langer; Produção: Lucki Sti­petic / Werner Herzog Filmproduktion;
Intérpretes: Bruce Spence (Lance Hac­kart, geólogo), Wandjurk Marika (Milisitbi), Roy Marika (Dayipu), Ray Barrett (Cole), Norman Kaye (Baldwin Ferguson), Coleen Clif­ford (miss Strehlow), Ralph Cotteril, Nicaias Lathouris, Basil Clar­ke, Ray Marshall, Dhungula I, Mariko, Gary Willioms, Tony Liewellyn-Jones, etc.;
Duração: 100 m. Rodado na Austrália.

1987
COBRA VERDE
(Cora Verde)
Realização: Werner Herzog; Argumento: Werner Herzog, segundo romance de Bruce Chatwin; Fotografia (cor, 35 mm): Viktor Ruzicka e Thomas Mauch; Direcção Artística: Fabrizio Carola; Música: Papal Vuh; Montagem: Maximiliane Moin­ka; Som: Hayma H. Heyder; Produção: Werner Herzog Filmproduktion/ ZDE /Ghana FiIm;
Intérpretes: Klaus Kinski (Francisca Manoel da Silva), King Ampaw (Taparica), José Lewgoy (Dom Octávio Coutinho), Salvatore Basile (Capitão Fraternidade), Peter Berhing (Bernardo), Guil­hermo Coronel (Euclides), Nona Agyefi Kwane II de Nsein (Bona Ahadec), Nona Fada Abada (Yovogan), Kofi Yerenkyi (Bakoko), Benito Stefanelhi (Capitão Pedro Vicente), Yobanda Garcia (Dono Epsiphania), etc.;
Duração: 110 m. Rodado no Brasil a no Ghana.

2 comentários:

Anónimo disse...

Isto é fabuloso. Estes filmes estiveram todos em exibição em Portugal?

Anónimo disse...

Olá, achei seu blog por acaso numa pesquisa sobre expressionismo alemão. Seu artigo é bastante esclarecedor.

Na verdade parei só pra deixar uma dica: se livre do fundo preto. Dificulta a leitura de textos longos. Para uma leitura mais ergonômica, tente inverter a cor da fonte com a do fundo. Fundo amarelinho ou bege + fonte preta. =)